01.9.2004 - A
Chechenia declarou independência
da Russia em 1991, mas o ex-presidente russo Boris Yeltsin esperou
até 1994 para enviar tropas a
região, para restaurar a autoridade de Moscou. A primeira guerra
da Chechenia terminou com uma humilhante derrota para as forças
russas em 1996. Em outubro de 1999, o então primeiro-ministro
russo (e depois presidente) Vladimir Putin deu inicio a uma nova ofensiva, uma "operação
antiterrorista" parcialmente desencadeada por uma onda de atentados contra
apartamentos em Moscou e em outras partes da Russia. Putin atribuiu os ataques a rebeldes
chechenos. Ainda no início de 1999, forças chechenas tentaram
estabelecer um Estado islãmico na republica autônoma russa do Daguestão, que faz fronteira
com a Chechenia. O que querem
os chechenos? A população média busca paz e tranquilidade. Os
combatentes rebeldes querem independência ou, pelo menos, um governo autônomo, que eles quase
obtiveram após 1996. Assim que as
forças militares deixaram
o país, em 1997, os
chechenos elegeram o seu próprio
presidente - Aslan Maskhadov, um ex-oficial da artilharia soviética que havia sido o
principal comandante militar dos rebeldes chechenos. A decisão sobre o status político da Chechenia foi adiada por
cinco anos, após um acordo de paz
ter sido negociado pelo governo checheno com Moscou. Mas, durante o período de paz, Maskhadov
foi incapaz de controlar seus comandantes mais radicais e a república rebelde
mergulhou na anarquia, tornando-se uma das "capitais mundiais" no ato
de tomar refens. No que se
transformou a política de Putin? Em outubro de 2003, o líder checheno pró-Moscou Akhmad
Kadyrov foi eleito presidente, após a realização de um controvertido referendo em março daquele ano. Os
principais rivais de Kadyrov se retiraram da disputa antes da eleição. O referendo
aprovou uma nova Constituição
que dava a Chechenia maior autonomia,
mas estipulava que a república continuaria
integrando a Russia. A eleição presidencial e o
referendo puderam ser realizadas apesar da crescente violência e da presença de milhares de
soldados russos na Chechenia. Se o presidente Putin imaginou que um líder pró-Moscou poderia
resolver o problema, o líder russo subestimou
a determinação e a brutalidade dos
rebeldes chechenos. Kadyrov já havia escapado de
uma série de tentativas de
assassinato até ter sido morto na
capital chechena, Grozni, em um mega-atentado a bomba num estádio de futebol,
realizado em maio deste ano. E os rebeldes seguiram atacando outros alvos na Russia. Diversos
atentados suicidas a bomba contra alvos russos têm sido realizados desde o cerco de um teatro
de Moscou em 2002, quando militantes chechenos tomaram centenas de reféns. Um ataque atribuído aos separatistas
chechenos em fevereiro e realizado no metrô moscovita matou dezenas de pessoas.
Continuam acontecendo ataques diários contra tropas russas na Chechenia e civis chechenos
seguem desaparecendo em decorrência
das operações de segurança das forças russas. Existem
perspectivas para a paz? Não. O plano da Russia de normalização da região está desordenado, após a morte de Kadyrov.
Novas eleições presidenciais serão realizadas na Chechenia no dia 29 de
agosto. O ministro do Interior checheno, Alu Alkhanov, deve ser o provável vencedor. Mas críticos e observadores
internacionais afirmam que eleições
limpas são impossíveis, já que a violência continua a
atingir a sofrida republica. Diferentemente de seu predecessor, Alkhanov não conta com uma forte
base de apoio. Os rebeldes não
deram qualquer sinal de que pretendem interromper seus ataques esporádicos, mas
destrutivos - que agora vêm se intensificando
através de atentados
suicidas. Autoridades russas disseram
que 250 rebeldes, disfarçados de policiais,
lançaram um ataque
coordenado em Grozni, no dia 21 de agosto, pouco antes de uma visita do
presidente Putin. Moscou não está disposta a realizar
negociações de paz com os
rebeldes e desde os atentados de 11 de setembro de 2001 tem havido pouca pressão internacional por
uma solução negociada por um
conflito. Os rebeldes têm ligações com a
Al-Qaeda? Parece provável. Sabe-se que há anos voluntários islãmicos viajaram para a
Chechenia para se aliar à luta pela independência. Segundo
relatos, eles aderiram aos rebeldes após terem feito treinamentos em campos do
Afeganistão e do Paquistão. Em outubro de
2002, um dos suspeitos de realizar de realizar os atentados de 11 de setembro
disse a um tribunal alemão que o suposto líder dos sequestradores dos aviões, Mohammed Atta,
pretendia combater na Chechenia.
Um dos principais militantes que combateu no conflito foi um árabe conhecido como
Khattab - um veterano da guerra do Afeganistão contra a então União Soviética. Khattab teria supostamente mantido ligações telefônicas com Osama Bin
Laden. Telefonemas interceptados também
fizeram com que autoridades americanas alegassem que combatentes chechenos
estabelecidos na Geórgia, perto da fronteira com a Chechenia, estavam em contato com a Al-Qaeda.
Isabelle Somma | 12/07/2006 00h00 A iminente desintegração
da União Soviética, em 1991, foi a grande chance encontrada pelos chechenos
para livrar-se de vez do domínio russo. O poderoso vizinho promovia incursões
militares desde o século 18, que resultavam em deportações e massacres de sua
população. A oportunidade, porém, mostrou-se um fiasco: Moscou não desistiria
facilmente de um território tão estratégico como o da Chechênia. Duas guerras e
dezenas de atentados terroristas seguiram-se à negativa russa de reconhecer a
independência. O resultado foi a morte de mais de 200 mil chechenos e soldados
russos e a fuga de mais da metade da população da região. Hoje a Chechênia é, sem dúvida, um dos piores
campos de batalha do planeta, em que guerrilheiros chechenos e tropas russas
travam combates cada vez mais sangrentos. “A guerra na Chechênia ainda se
arrasta. Apesar de uma campanha bastante cruel que visa eliminar os combatentes
chechenos e seus partidários, as forças russas falharam em acabar com a
resistência e em capturar líderes como Shamil Basayev”, afirma o professor
Georgi Deluguian, especialista em Repúblicas do Cáucaso da Universidade
Northwestern, nos Estados Unidos. Petróleo
e gás A
Chechênia está localizada no Cáucaso, região que abriga grandes reservas de
petróleo e gás natural. Os oleodutos que abastecem os compradores têm de passar
por boa parte dos 13 mil quilômetros quadrados do território checheno. É essa
ligação o principal interesse da Federação Russa na região. Os russos também
acreditam que a região é parte integrante de seu território, ao contrário de
outras repúblicas, como o Cazaquistão e a Ucrânia, que, logo após a queda da
União Soviética, se tornaram países independentes sem nenhuma resistência do
governo central. O Cáucaso, região
montanhosa entre o mar Cáspio e Negro onde vivem vários grupos étnicos, está
sob o domínio russo há muito tempo. Mesmo quando não se sabia da existência de
petróleo na região, o então Império Russo também considerava o território
estratégico. Duas rebeliões chechenas, em 1791 e em 1859, foram sufocadas pelas
tropas czaristas. A Revolução Russa de 1917 não mudou muito a vida da população
caucasiana. Com a ascensão bolchevique, a população sofreu um forçado processo
de coletivização da produção agrícola nos anos 30. Em 1936, a Chechênia tornou-se uma república
autônoma dentro da então União Soviética, juntamente com a Inguchétia. Mas a
autonomia duraria pouco. Ao final da Segunda Guerra, Josef Stalin ordenou a
deportação de chechenos e inguchétios, acusando-os de colaboração com os
nazistas, o que realmente havia acontecido. Os habitantes da região tinham
apoiado os alemães para obter em troca a tão sonhada independência. O castigo
infligido pelo ditador foi deportar entre 400 mil e 800 mil pessoas para a Ásia
Central e Sibéria. A volta do exílio só seria permitida em 1956, três anos após
a morte do ditador. Duas
guerras Desde
1936, chechenos e inguchétios viveram sob o status de uma mesma República
Autônoma. Em 1991, os chechenos declararam-se independentes e formaram uma
república. A Inguchétia também aproveitou para separar-se da Chechênia. Mas
nenhum país reconheceu sua independência. Três anos depois, o impasse foi parar
no campo de batalha. Tropas russas voltaram à região e destruíram a capital,
Grozny. Nessa primeira guerra, mais de 80 mil pessoas morreram, principalmente
civis chechenos. A guerrilha chechena
buscou a ajuda de radicais islâmicos como os experientes combatentes da guerra
do Afeganistão e o auxílio financeiro da Arábia Saudita. A tática deu certo. Em
1996, o então presidente russo, Boris Yeltsin, retirou o exército da região.
Seguiram-se anos de tensão até que o novo presidente russo, Vladimir Putin,
ordenasse uma nova invasão. Dessa vez, o governo russo conseguiu emplacar um
presidente pró-Moscou. O primeiro deles, Akhmad Kadyrov, morreu num atentado
suicida em 2004. O atual, general Alu Alkhanov, mantém-se no poder graças às
tropas de Putin. Tanto os governantes
apoiados por Moscou quanto as tropas russas são acusadas de freqüentes abusos
contra a população chechena, como massacres, estupros e tortura. Além disso, a
deterioração da economia local e o surgimento do crime organizado fizeram com
que houvesse uma radicalização do conflito, com a aproximação chechena do
fundamentalismo islâmico. Atualmente, as
forças chechenas estão divididas entre os seguidores do presidente pró-Moscou e
os guerrilheiros contrários ao domínio russo, que, por sua vez, se fragmentaram
em vários grupos que também lutam entre si. Esses grupos são formados por
antigos agricultores e trabalhadores de baixa qualificação que não conseguiram
fugir do país. “A fragmentação de forças dos dois lados continua estável e
conduz a uma perpetuação da violência, porque nenhum governo estável consegue
surgir”, afirma Derluguian.