terça-feira, 29 de março de 2016

Entenda o conflito na Chechenia

01.9.2004  -  A Chechenia declarou independência da Russia em 1991, mas o ex-presidente russo Boris Yeltsin esperou até 1994 para enviar tropas a região, para restaurar a autoridade de Moscou. A primeira guerra da Chechenia terminou com uma humilhante derrota para as forças russas em 1996.  Em  outubro de 1999, o então primeiro-ministro russo (e depois presidente) Vladimir Putin deu inicio a uma nova ofensiva, uma "operação antiterrorista" parcialmente desencadeada por uma onda de atentados contra apartamentos em Moscou e em outras partes da Russia. Putin atribuiu os ataques a rebeldes chechenos. Ainda no início de 1999, forças chechenas tentaram estabelecer um Estado islãmico na republica autônoma russa do Daguestão, que faz fronteira com a Chechenia.    O que querem os chechenos?  A população média busca paz e tranquilidade. Os combatentes rebeldes querem independência ou, pelo menos, um governo autônomo, que eles quase obtiveram após 1996. Assim que as forças militares deixaram o país, em 1997, os chechenos elegeram o seu próprio presidente - Aslan Maskhadov, um ex-oficial da artilharia soviética que havia sido o principal comandante militar dos rebeldes chechenos.  A decisão sobre o status político da Chechenia foi adiada por cinco anos, após um acordo de paz ter sido negociado pelo governo checheno com Moscou. Mas, durante o período de paz, Maskhadov foi incapaz de controlar seus comandantes mais radicais e a república rebelde mergulhou na anarquia, tornando-se uma das "capitais mundiais" no ato de tomar refens.       No que se transformou a política de Putin?   Em outubro de 2003, o líder checheno pró-Moscou Akhmad Kadyrov foi eleito presidente, após a realização de um controvertido referendo em março daquele ano. Os principais rivais de Kadyrov se retiraram da disputa antes da eleição. O referendo aprovou uma nova Constituição que dava a Chechenia maior autonomia, mas estipulava que a república continuaria integrando a Russia. A eleição presidencial e o referendo puderam ser realizadas apesar da crescente violência e da presença de milhares de soldados russos na Chechenia.  Se o presidente Putin imaginou que um líder pró-Moscou poderia resolver o problema, o líder russo subestimou a determinação e a brutalidade dos rebeldes chechenos.  Kadyrov já havia escapado de uma série de tentativas de assassinato até ter sido morto na capital chechena, Grozni, em um mega-atentado a bomba num estádio de futebol, realizado em maio deste ano. E os rebeldes seguiram atacando outros alvos na Russia. Diversos atentados suicidas a bomba contra alvos russos têm sido realizados desde o cerco de um teatro de Moscou em 2002, quando militantes chechenos tomaram centenas de reféns.   Um ataque atribuído aos separatistas chechenos em fevereiro e realizado no metrô moscovita matou dezenas de pessoas. Continuam acontecendo ataques diários contra tropas russas na Chechenia e civis chechenos seguem desaparecendo em decorrência das operações de segurança das forças russas.    Existem perspectivas para a paz?    Não. O plano da Russia de normalização da região está desordenado, após a morte de Kadyrov. Novas eleições presidenciais serão realizadas na Chechenia no dia 29 de agosto. O ministro do Interior checheno, Alu Alkhanov, deve ser o provável vencedor. Mas críticos e observadores internacionais afirmam que eleições limpas são impossíveis, já que a violência continua a atingir a sofrida republica.  Diferentemente de seu predecessor, Alkhanov não conta com uma forte base de apoio. Os rebeldes não deram qualquer sinal de que pretendem interromper seus ataques esporádicos, mas destrutivos - que agora vêm se intensificando através de atentados suicidas.  Autoridades russas disseram que 250 rebeldes, disfarçados de policiais, lançaram um ataque coordenado em Grozni, no dia 21 de agosto, pouco antes de uma visita do presidente Putin.  Moscou não está disposta a realizar negociações de paz com os rebeldes e desde os atentados de 11 de setembro de 2001 tem havido pouca pressão internacional por uma solução negociada por um conflito.   Os rebeldes têm ligações com a Al-Qaeda?      Parece provável. Sabe-se que há anos voluntários islãmicos viajaram para a Chechenia para se aliar à luta pela independência. Segundo relatos, eles aderiram aos rebeldes após terem feito treinamentos em campos do Afeganistão e do Paquistão. Em outubro de 2002, um dos suspeitos de realizar de realizar os atentados de 11 de setembro disse a um tribunal alemão que o suposto líder dos sequestradores dos aviões, Mohammed Atta, pretendia combater na Chechenia. Um dos principais militantes que combateu no conflito foi um árabe conhecido como Khattab - um veterano da guerra do Afeganistão contra a então União Soviética. Khattab teria supostamente mantido ligações telefônicas com Osama Bin Laden.  Telefonemas interceptados também fizeram com que autoridades americanas alegassem que combatentes chechenos estabelecidos na Geórgia, perto da fronteira com a Chechenia, estavam em contato com a Al-Qaeda.
Isabelle Somma | 12/07/2006 00h00    A iminente desintegração da União Soviética, em 1991, foi a grande chance encontrada pelos chechenos para livrar-se de vez do domínio russo. O poderoso vizinho promovia incursões militares desde o século 18, que resultavam em deportações e massacres de sua população. A oportunidade, porém, mostrou-se um fiasco: Moscou não desistiria facilmente de um território tão estratégico como o da Chechênia. Duas guerras e dezenas de atentados terroristas seguiram-se à negativa russa de reconhecer a independência. O resultado foi a morte de mais de 200 mil chechenos e soldados russos e a fuga de mais da metade da população da região.  Hoje a Chechênia é, sem dúvida, um dos piores campos de batalha do planeta, em que guerrilheiros chechenos e tropas russas travam combates cada vez mais sangrentos. “A guerra na Chechênia ainda se arrasta. Apesar de uma campanha bastante cruel que visa eliminar os combatentes chechenos e seus partidários, as forças russas falharam em acabar com a resistência e em capturar líderes como Shamil Basayev”, afirma o professor Georgi Deluguian, especialista em Repúblicas do Cáucaso da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos.  Petróleo e gás    A Chechênia está localizada no Cáucaso, região que abriga grandes reservas de petróleo e gás natural. Os oleodutos que abastecem os compradores têm de passar por boa parte dos 13 mil quilômetros quadrados do território checheno. É essa ligação o principal interesse da Federação Russa na região. Os russos também acreditam que a região é parte integrante de seu território, ao contrário de outras repúblicas, como o Cazaquistão e a Ucrânia, que, logo após a queda da União Soviética, se tornaram países independentes sem nenhuma resistência do governo central.  O Cáucaso, região montanhosa entre o mar Cáspio e Negro onde vivem vários grupos étnicos, está sob o domínio russo há muito tempo. Mesmo quando não se sabia da existência de petróleo na região, o então Império Russo também considerava o território estratégico. Duas rebeliões chechenas, em 1791 e em 1859, foram sufocadas pelas tropas czaristas. A Revolução Russa de 1917 não mudou muito a vida da população caucasiana. Com a ascensão bolchevique, a população sofreu um forçado processo de coletivização da produção agrícola nos anos 30.  Em 1936, a Chechênia tornou-se uma república autônoma dentro da então União Soviética, juntamente com a Inguchétia. Mas a autonomia duraria pouco. Ao final da Segunda Guerra, Josef Stalin ordenou a deportação de chechenos e inguchétios, acusando-os de colaboração com os nazistas, o que realmente havia acontecido. Os habitantes da região tinham apoiado os alemães para obter em troca a tão sonhada independência. O castigo infligido pelo ditador foi deportar entre 400 mil e 800 mil pessoas para a Ásia Central e Sibéria. A volta do exílio só seria permitida em 1956, três anos após a morte do ditador.  Duas guerras    Desde 1936, chechenos e inguchétios viveram sob o status de uma mesma República Autônoma. Em 1991, os chechenos declararam-se independentes e formaram uma república. A Inguchétia também aproveitou para separar-se da Chechênia. Mas nenhum país reconheceu sua independência. Três anos depois, o impasse foi parar no campo de batalha. Tropas russas voltaram à região e destruíram a capital, Grozny. Nessa primeira guerra, mais de 80 mil pessoas morreram, principalmente civis chechenos.  A guerrilha chechena buscou a ajuda de radicais islâmicos como os experientes combatentes da guerra do Afeganistão e o auxílio financeiro da Arábia Saudita. A tática deu certo. Em 1996, o então presidente russo, Boris Yeltsin, retirou o exército da região. Seguiram-se anos de tensão até que o novo presidente russo, Vladimir Putin, ordenasse uma nova invasão. Dessa vez, o governo russo conseguiu emplacar um presidente pró-Moscou. O primeiro deles, Akhmad Kadyrov, morreu num atentado suicida em 2004. O atual, general Alu Alkhanov, mantém-se no poder graças às tropas de Putin.   Tanto os governantes apoiados por Moscou quanto as tropas russas são acusadas de freqüentes abusos contra a população chechena, como massacres, estupros e tortura. Além disso, a deterioração da economia local e o surgimento do crime organizado fizeram com que houvesse uma radicalização do conflito, com a aproximação chechena do fundamentalismo islâmico.  Atualmente, as forças chechenas estão divididas entre os seguidores do presidente pró-Moscou e os guerrilheiros contrários ao domínio russo, que, por sua vez, se fragmentaram em vários grupos que também lutam entre si. Esses grupos são formados por antigos agricultores e trabalhadores de baixa qualificação que não conseguiram fugir do país. “A fragmentação de forças dos dois lados continua estável e conduz a uma perpetuação da violência, porque nenhum governo estável consegue surgir”, afirma Derluguian.  

0 comentários:

Postar um comentário