17.4.2016 - O
plenário da Câmara aprovou neste domingo (17/04) a continuidade do processo de
impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. O resultado deixou evidente o
fracasso das últimas costuras políticas do governo – mas as dificuldades
enfrentadas pela petista já vêm surgindo desde que ela assumiu o seu segundo mandato,
no início de 2015. Veja a seguir seis razões que levaram o governo à derrota. Decadência
da economia Em outubro de 2014, Dilma conseguiu
recuperar parte da popularidade perdida nos protestos de 2013. Pesquisa do
Datafolha mostrou que 42% da população tinham uma imagem positiva da
presidente. Em janeiro de 2015, no entanto, o governo começou a revelar o
tamanho das dificuldades econômicas que haviam sido omitidas durante a campanha
eleitoral do ano anterior. Poucas semanas depois da vitória, Dilma começou a
cortar gastos e tomar outras medidas impopulares. A oposição acusou o governo
de ter praticado um “estelionato eleitoral”. Em março, antes mesmo de a
extensão do escândalo da Petrobras ser revelada, a popularidade Dilma desabou
para 13%. No mesmo mês, surgiram as acusações envolvendo as “pedaladas fiscais”
– que viriam a se tornar a razão jurídica do impeachment. A fórmula econômica
dos anos 2003-2014, que privilegiou o crescimento por meio do consumo, desonerando
impostos, também cobrou seu preço. Abatimentos nas tarifas de luz, que causaram
rombos bilionários, tiveram que ser revertidos, o que pressionou a inflação. O
dólar subiu, o país teve suas notas rebaixadas, e uma crise de confiança se
instalou no país. No final de 2015, o
PIB sofreu uma queda de 3,8%. O governo também se mostrou incapaz de aprovar
reformas para reverter o quadro. Para chefiar o ajuste, Dilma escolheu Joaquim
Levy para chefiar a Fazenda, mas o ministro acabou sofrendo resistência do
próprio PT. A relação deteriorada
com o Congresso também não permitiu a aprovação de reformas. Aos poucos,
federações e entidades do comércio e da indústria, que viveram uma lua de mel
com Lula, passaram a se voltar contra o governo. Isolamento e revolta do PMDB Maior
partido do Brasil, o PMDB é desde a redemocratização uma peça fundamental na
base aliada de todos os governos. A legenda atravessou os anos Lula (2003-2010)
em harmonia com os petistas. Logo após a
posse, no entanto, o relacionamento começou a sofrer fissuras. Dilma e seu
círculo decisório passaram a privilegiar o relacionamento com legendas médias e
nanicas, tentando isolar o PMDB. A insatisfação na sigla foi crescendo, e
vários dos seus membros passaram a se queixar que a presidente não
compartilhava o poder. Em 2014, a convenção do PMDB aprovou apoio à reeleição
de Dilma por 59% dos votos. Em 2010, o percentual havia sido de 85%. No início
de 2015, a Câmara elegeu o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como presidente. Dilma
havia apostado todas as fichas na eleição de outro candidato, perdeu e teve que
engolir Cunha, que passou a vocalizar a insatisfação de setores da sua sigla e
de outros partidos da base. Em 2011, 89% dos deputados da base votaram seguindo
as orientações do governo. Em 2014, a taxa caiu para 66%. A agressividade de
Cunha foi aumentando conforme o deputado era atingido por denúncias de
corrupção, que ele atribuía a maquinações do Planalto. O governo também avaliou
mal a força do deputado, tendo apostado que as denúncias acabariam por
derrubá-lo. Para tentar pacificar o PMDB e outros partidos da base,
Dilma acabou convocando seu vice, Michel Temer, para chefiar a articulação
política. Mas Temer foi seguidamente sabotado por outros petistas. Quatro meses
depois, Temer abandonou a função e passou a pender para o lado rebelde do PMDB.
Por fim, os anos de insatisfação culminaram no desembarque da maior parte da
sigla. Estilo
centralizador e falta de habilidade política No período anterior à primeira eleição
de Dilma, o ex-presidente Lula lapidou a imagem da sua protegida como uma
“gerentona” e tecnocrata exigente. No entanto, outros traços da presidente
acabaram vindo à tona, como sua tendência centralizadora e falta de paciência
com negociações políticas – em contraste com seu antecessor e padrinho. “Dilma
é muito convencida de que sabe tudo e que está sempre certa", diz o
professor David Fleischer, da Universidade Nacional de Brasília (UnB). Pouco
afeita a ouvir conselhos, Dilma despertou queixas até mesmo em Lula, que em
2015 disse que a presidente “não o ouvia”. A presidente também passou a se
isolar. Delegou tarefas para assessores que não gozavam de popularidade junto
ao Congresso ou nunca concedeu autonomia para que eles desempenhassem suas
funções com eficiência. Corrupção
e Operação Lava Jato Nos últimos dois anos, a operação Lava
Jato adicionou um fator de imprevisibilidade na política brasileira. Até o
momento, Dilma não foi pessoalmente implicada no esquema, mas o escândalo
corroeu a imagem do seu governo, conforme os investigadores foram revelando o
envolvimento de ministros, do seu tesoureiro de campanha e de figuras
influentes do PT. Outros partidos e
políticos, como Cunha, foram implicados, mas as revelações – propagandeadas
intensamente pela imprensa – tiveram principalmente o efeito de enterrar a
imagem de intolerância com a corrupção que Dilma tentou cultivar no seu
primeiro mandato. Os escândalos também aumentaram a agressividade de aliados do
governo que foram arrastados para as investigações. Mesmo dentro do PT, cresceu
a impressão de que o governo não estava fazendo nada para tentar deter os
vazamentos da operação. Por fim, a Lava Jato acabou torpedeando a
popularidade de Lula, que passou a ser investigado por sua ligação com
empreiteiras. Quando o petista finalmente foi nomeado para um cargo no governo
da sua sucessora, membros do PT avaliaram que o ex-presidente injetaria força
na articulação política, mas a manobra acabou prejudicando ainda mais o
Planalto. No final, a nomeação foi vista como uma tentativa de salvar Lula da
cadeia. Polarização Nas três eleições anteriores a 2014, os
partidos de oposição seguiram um padrão comum: após a derrota, se isolavam e
gastavam seu tempo em lutas internas pelo poder. No pleito de 2014, porém, algo
mudou. Após a vitória apertadíssima de Dilma, os partidos de oposição não se
desmobilizaram e passaram a tentar reverter o resultado antes das eleições de
2018. "A oposição sabe que perdeu uma oportunidade quando não se aproveitou
da crise do Mensalão em 2005”, afirma Gaspard Estrada. Primeiro, o PSDB e seus
aliados exigiram uma recontagem dos votos. Depois, passaram a pedir a anulação
do pleito alegando que dinheiro sujo abasteceu a campanha de Dilma. Os
oposicionistas também se aproximaram do rebelde Eduardo Cunha, tendo na prática
formado uma aliança com o peemedebista. Não foi só a oposição que mudou o
comportamento. Setores da população insatisfeitos se tornaram mais ativos. Dois
meses depois do início do segundo mandato de Dilma, o país registrou seu
primeiro “panelaço”. Em março de 2015, ocorreram os primeiros grandes protestos
contra o governo. Segundo analistas, a ruptura começou nos protestos de
2013, que escancararam pela primeira vez o descontentamento de parte da
população e causaram o primeiro abalo na retórica triunfalista dos petistas,
que ainda surfavam na popularidade dos anos Lula. "É um ambiente
intoxicante. Algo que começou em 2013 e que se instalou de vez na eleição de
2014”, afirma Estrada. Esgotamento
do modelo político Para especialistas, a
“tempestade perfeita” que atingiu Dilma também foi alimentada pelo esgotamento
do modelo de presidencialismo de coalizão brasileiro, que estimula a
multiplicação de partidos sem identidade, leva o governo da vez a formar amplas
maiorias que muitas vezes acabam criando contradições com o programa do
presidente eleito e estimula a troca de favores e a nomeação de políticos sem
experiência administrativa. “O sistema político brasileiro vem sendo mantido
nos últimos anos da mesma maneira que os cubanos mantêm velhos carros
americanos funcionando: no improviso e sem qualquer perspectiva de melhora”,
afirma o cientista político Peter Hakim, do Instituto de Análise Política
Inter-American Dialogue. Segundo ele, o sistema ainda conseguiu
funcionar com figuras fortes como Lula e Fernando Henrique Cardoso. “Mas seria
impossível contar com superlíderes todo o tempo para administrar tudo”, opina.
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